sábado, 28 de março de 2015

O que é dignidade da pessoa humana?

Já repararam como muita gente fala em dignidade da pessoa humana de forma aleatória sem a menor organização de pensamento?
Muitos usam a expressão dignidade da pessoa humana para defender direitos fundamentais, mas sem alcançar o âmago do conceito e seus respectivos contornos. Por conta disto, inúmeras vezes a utilização da expressão acaba ocorrendo em contextos diametralmente opostos aos escopos constitucionais para justificar o direito à vida, à liberdade, à saúde e assim por diante. O mencionado paradoxo nos leva a compreender o porquê da necessidade em se fazer algumas reflexões sobre realidades e sofismas[1] na fixação de um conceito uníssono e coerente quanto à expressão “dignidade da pessoa humana”, o qual possa servir como base sólida em prol da defesa dos direitos es-senciais do ser humano, sob pena de deixá-los sem qualquer amparo efetivo e, por conseguinte, sem garantia de respeito.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, assinala o princípio da humanidade e da dignidade já no seu preâmbulo:
Considerando que o reconhecimento da dignidade ine-rente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo (…). Conside-rando que as Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e valor da pessoa humana (…).
A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, de 1969, estabelece, em seu art. 11, § 1º, que “Toda pessoa humana tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade”.
Derivando de um dos fundamentos republicanos, constante do art. 1º, inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil, declara a dignidade da pessoa humana, o princípio da humanidade é descrito no art. 5º, incisos III e XLIX.
Conforme bem define Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho[2]:
Contudo foi com o Iluminismo que a noção de dignidade da pessoa humana ganhou uma dimensão mais racional e passou a irradiar efeitos jurídicos, sobretudo por influen-cia do pensamento de Immanuel Kant. O homem, então passa a ser compreendido por sua natureza racional e com capacidade de autodeterminação (…).
Fato é, existe extrema dificuldade em conceituar Dignidade da Pessoa Humana, mesmo entre os estudiosos do tema, onde enconttramos definições, as mais variadas possíveis. Senão Vejamos:
Ingo Sarlet[3] define da seguinte forma:
(…) por dignidade da pessoa humana a qualidade intrín-seca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um comple-xo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degra-dante e desumano, como venham a lhe garantir as condi-ções existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corres-ponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humano (…).
Ainda sobre dignidade da pessoa humana afirma Gustavo Tepedino[4]:
Com efeito, a escolha da dignidade da pessoa humana como fundamento da República, associada ao objetivo fundamental de erradicação da pobreza e da marginalização, e de redução das desigualdades sociais, juntamente com a previsão do § 2º do art. 5º no sentido da não ex-clusão de quaisquer direitos e garantias, mesmo que não expressos, desde que decorrentes dos princípios adotados pelo texto maior, configuram uma verdadeira cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana, tomada como valor máximo pelo ordenamento (…)
Aquilo que porventura não tenha um preço, pode ser trocado ou pode ser substituído por qualquer outra coisa equivalente e relativa, enquanto aquilo que não é um valor relativo é superior a qualquer preço. Trata-se de um valor interno e não admite ser substituto por algo equivalente. Isso é o que tem uma dignidade.
De outro lado, a filosofia kantiana mostra que o homem, como ser racional, existe como fim em si, não simplesmente como meio; enquanto os seres desprovidos de razão têm um valor relativo e condicionado (ao de meios), eis porque são chamados de “coisas”; ao contrário, os seres racionais são chamados de pessoas, porque sua natureza já os designa como fim em si, ou seja, como algo que não pode ser empregado simplesmente como meio e consequentemente limita na mesma proporção o nosso arbítrio, por ser um objeto de respeito. E assim se revela como um valor absoluto, porque a natureza racional existe como fim em si mesmo. Desta forma, o ser humano, por ser detentor do fim em si mesmo, tem sua dignidade como algo superior a todos os demais direitos ou garantias que possam ser ou vir a ser expressos[5].
Nesse sentido, reflita sobre: Como querer a prevalência de uma lei que tenha utilidade social em detrimento da própria pessoa que integra a sociedade? Como justificar a violação de um direito cuja finalidade seria proteger “os direitos”, mas a norma viola para proteger, então se protege violando? Afinal, não estaríamos protegendo apenas quem queremos e na verdade esquecendo todo o “resto”? Será mesmo que as leis são feitas por humanos, para proteger seres humanos, ou os seres humanos devem e estão a proteger as leis? Talvez fosse melhor mudarmos para “dignidade da lei”. Assim, assumiríamos de uma vez por todas que a sociedade serve a lei e não o contrário. Deixaríamos de ser hipócritas e mostraríamos que é imposssível defender direitos humanos sem ao menos uma vez ser ser humano. O que é ser, humano?
Publicado originalmente em : Justificando.com  / Por Thiago M. Minagé 

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