quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Abandono Afetivo - Indenização por Danos Morais





O recente julgamento do Recurso Especial 1.159.242/SP, relatado pela Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, julgado em 24/04/2012, inaugurou a adoção definitiva da indenização por danos morais em face do denominado abandono afetivo.
Primeiramente, vale esclarecer que o abandono afetivo consiste na indiferença afetiva dispensada por um genitor a sua prole, o que gera um desajuste familiar, e assim, necessita de soluções de terapeutas e especialistas.
Recentemente, essa discussão familiar chegou as salas de audiências e tribunais, uma vez que o filho busca ser recompensado pelo pai sob a forma de indenizações pecuniárias, pelo ilícito cometido, ou seja, não comparecimento do seu genitor aos atos da vida, relacionados ao desenvolvimento social e psíquico
Ao proferir a sua decisão, a ilustre relatora do Recurso Especial em questão, consignou que o abandono afetivo constitui descumprimento do dever legal de cuidado, criação, educação e companhia, que está presente, implicitamente, no artigo227 da Constituição Federal, e assim, a omissão que caracteriza ato ilícito é passível de compensação pecuniária.
Nesse sentido, em sua tese, a ilustre relatora afirmou que o sofrimento imposto a prole deve ser compensado financeiramente.
Importante ressaltar que apesar da família ter funções e finalidade, não existe um padrão cultural, um modelo a ser seguido. Os genitores têm obrigações legais e morais, entretanto, não ultrapassam o direito de livre arbítrio, de modo que é possível o planejamento familiar sem a intervenção do Estado. Assim, cabe aos pais escolher livremente a maneira de viver, observando, obviamente, os direitos fundamentais e constitucionais previstos em nossa legislação, que protege, principalmente, a dignidade da pessoa humana.
A orientação dos pais é imprescindível na formação dos filhos. É fácil verificar, pelo comportamento, o indivíduo que cresceu com apoio, cooperação, assistência, dedicação e amor de uma família bem estruturada.
O afeto é extremamente importante quando o alvo é a família, como discorre Rolf Madaleno¹:
“O afeto é mola propulsora dos relacionamentos familiares e das relações interpessoais movidas pelo sentimento e pelo amor, para ao fim e ao cabo dar sentido e dignidade à existência. A afetividade deve estar presente nos vínculos de filiação e de parentesco, variando tão-somente na sua intensidade e nas especificidades do caso concreto”.
A boa formação familiar produz efeitos não somente ao indivíduo, mas também nas relações sociais em geral. Por essa razão, a ausência na formação dos filhos deve ser vista como uma omissão danosa, e passível de reparação, a qual compete ao Judiciário determinar.
A responsabilidade civil é a consequência diante da inércia do devedor diante do cumprimento de uma obrigação. Possui uma função preventiva, no sentido de impedir que o sujeito pratique constantemente o ato ilícito.
Além disso, a responsabilidade civil serve para desestimular as condutas consideradas socialmente lesivas, pelo estabelecimento de uma sanção pecuniária ao seu agente.
“A finalidade econômica da responsabilidade civil é induzir os autores e vítimas de lesões a internalizarem os custos do dano que pode ocorrer em consequência da falta de cuidado. O direito da responsabilidade civil internaliza esses custos fazendo o causador da lesão indenizar a vítima. Quando os autores de atos ilícitos em potencial internalizam os custos dos danos que causam, eles têm incentivo para investir em segurança no nível eficiente. A essência econômica do direito da responsabilidade civil consiste em seu uso da responsabilização para internalizar externalidades criadas por custos de transação elevados.²”
Os pais omissos não podem e nem devem ficar impunes diante de uma situação tão grave. A indenização não faz com que desapareça a dor suportada pelo filho pela falta de afeto, entretanto, visa reparar o irreparável, pois não adianta querer recuperar algo que jamais se teve como o afeto.
Importante esclarecer que não se pode obrigar um pai a dar amor a seu filho, no entanto, o mesmo não pode negligenciar ao filho os deveres inerentes à função de pai. Neste sentido, dispõe Rodrigo da Cunha Pereira³:
[...] “não é possível obrigar ninguém a amar. No entanto a esta desatenção e a este desafeto devem corresponder uma sanção, sob pena de termos um direito acéfalo, um direito vazio, um direito inexigível. Se um pai ou mãe não quiserem, dar atenção, carinho e afeto àqueles que trouxeram ao mundo, ninguém pode obrigá-los, mas a sociedade cumpre o papel solidário de lhes dizer, de alguma forma, que isso não está certo e que tal atitude pode comprometer a formação e o caráter dessas pessoas abandonadas afetivamente”.
Conclui-se então que o valor da indenização é simbólico, e trata-se de uma função educativa, vez que não há dinheiro que pague a falta de amor, a rejeição dos pais à um filho. O alimento imprescindível para a alma é o amor, o afeto.

Publicado originalmente por Fernanda Ciardo, em Jusbrasil.com.br / Imagem : Google

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